Mostrando postagens com marcador HISTÓRIA. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador HISTÓRIA. Mostrar todas as postagens

domingo, 1 de dezembro de 2013

REPORTAGEM : LOTINHO E TABAJARA – O General que desafiou preconceitos e é um dos bambas do samba da cidade

Arlindo Oliveira Filho, Lotinho
Arlindo Oliveira Filho, Lotinho, descende de uma família de músicos que, entre outras coisas criou o rancho carnavalesco Tenentes Negros, em 1936, e o Clube José do Patrocínio, vulgo Caba-Roupa, nos anos de 1950. Educado em um ambiente musical, festivo e carnavalesco, sua infância foi embalada pelos acordes do cavaquinho tocado pelo pai. Com o Tio Devanir Alves, aprendeu as primeiras notas musicais no trombone de vara. Ao som das canções executadas pelo acordeão do tio Cidica iniciou, aos 13 anos de idade, sua trajetória de cantor boêmio.

Integrantes do rancho carnavalesco Tenentes Negros
A partir das intermináveis conversas entoadas com os familiares mais velhos, Lotinho soube que determinados bares e clubes da cidade eram vetados aos negros. Exceção feita aos músicos e faxineiros que a eles adentravam somente para trabalhar. Entretanto graças a seu talento, Lotinho foi convidado na década de 1950 a apresentar-se no Uberlândia Clube. O convite foi recebido por ele com reservas: “Mas vocês não aceitam negro lá! Olha lá hein? A gente vai sofrer desfeita lá!”. Depois de muito diálogo com os diretores do clube, foi fechado o contrato. Cônscio do desafio assumido, Lotinho rapidamente se dirigiu à Loja Clark onde comprou dois pares de sapatos de verniz, sendo um par branco e outro preto. Logo após, deslocou-se até a Alfaiataria Paganini e encomendou um terno e uma camisa de casimira Europa.

Sobre a sua primeira apresentação no Uberlândia Clube, relembra o antigo boêmio: “cantei como nunca havia cantado até então”. No dia seguinte à estreia, Lotinho foi cumprimentado por todos que o encontrava, mas também censurado por muitos negros que viam naquela apresentação uma “traição”, no mínimo, uma “rendição” ao preconceito vigente na cidade.

Apesar dos elogios, críticas e ameaças que recebeu, Lotinho acreditava que suas apresentações contribuíram para a valorização do negro na sociedade uberlandense: “É que, antes de eu assinar contrato com o Uberlândia, os pretos não andavam no mesmo passeio que os brancos [...] E o fato do negrinho pegar o microfone e encantar no Uberlândia Clube ajudou a acabar com aquele negócio na avenida”.

Como cantor profissional, Lotinho também animou as noites do Cassino Monte Carlo, da Boate do Marra e Rádio Educadora, onde tinha um programa semanal levado ao ar todas as quintas-feiras às 20h. Por prazer cantou nos inúmeros bordéis localizados na rua Sem Sol, atual Engenheiro Azélli.

Criativo e inquieto culturalmente participou como cantor, ator e cinegrafista de diversos espetáculos musicais e teatrais realizados pelo clube Caba-Roupa: “ O Clube José do Patrocínio, desta cidade, realizou sábado passado grande show artístico, denominado ‘O Mercador de Sonho’. (...) Foi diretor organizador  e ensaiador, o senhor Joaquim Coelho. Orquestra sobre direção de Anízio L. Camilo. Cenários de Lotinho e Veiga Lago. O espetáculo foi variado, com diversos números que agradaram plenamente a plateia: cantos, bailados, humoristas, a peça ‘Tenda Árabe’ inspirada na mesma música em dois atos (Correio de Uberlândia, 1953, n. 3572, p.3)”.

Em 1954, Lotinho com outros jovens residentes no bairro Patrimônio fundou na rua Augusto dos Anjos, residência do casal Alberto Alves Carvalho e Darcy . Carvalho, a Escola de Samba Tabajara. Por dirigir a bateria, desenhar as fantasias e ensinar as cabrochas da Escola a dançar, Lotinho passou a ser chamado pela imprensa local de General. Sob seu comando, a Tabajara venceu o I Concurso de Escolas de Samba de Uberlândia, realizado em 1956 pela Rádio Educadora. Com o tricampeonato obtido em 1959, a Tabajara tornou-se presença obrigatória nos bailes carnavalescos do Uberlândia e Praia Clube: “ Na noite de terça-feira gorda, antes do início do baile carnavalesco, a escola campeã do carnaval de rua deste ano visitou o salão de festas do Uberlândia Clube.  Foi uma nota em destaque a valer por qualquer show. Os palacianos aplaudiram espetacularmente as evoluções dos passistas, das cabrochinhas e deliraram ao som do ritmo quente na batida do samba (Correio de Uberlândia, 1959, n. 6981, p.1)

A escola Tabajara em um desfile carnavalesco nos idos dos anos de 1950 , já
chamava a atenção do público.


No entanto as relações de Lotinho com o carnaval uberlandense nem sempre foram amistosas. Na segunda metade dos anos 1960, ele entrou em colisão com o então prefeito Renato de Freitas: “O meu desentendimento com o Renato de Freitas foi causado porque eu não o apoiei nas eleições. Ele disse que iria suspender a Tabajara e que a Escola não ganharia mais nenhum carnaval em Uberlândia, e tem mais, ele deixou as Escolas de Samba na mão, enfraquecendo o carnaval de Uberlândia, foi só isso”. Diante da ameaça recebida, o General protestou compondo um samba cuja a estrofe inicial, em tom provocativo, fazia o seguinte desafio:
“Andam dizendo por ai
Que a tabajara vai perder
Eu quero ver
Eu quero ver pra crer
Nós somos conformados
Mas depois do jurado
Quero ver resultado”

Hoje, as experiências boêmias e carnavalescas de Arlindo de Oliveira Filho estão encerradas. Alegando estar com os “dedos enferrujados” e com a “memória fraca”, raramente, toca um violão e canta uma das várias canções que compôs e/ou aprendeu através do rádio e dos discos.

Apesar de ignorado pelo poder público e desconhecido por boa parte dos membros da Escola de Samba que ajudou a fundar e a ganhar diversos títulos, o antigo General ainda sobrevive. O motivo? Talvez por acreditar no que disse Lupicínio Rodrigues: “É na noite que se faz música, que se diz poesia com mais sentimento. É onde, enfim, o amor é mais amor”.


Escrito por:
Júlio César, doutor em História Social pela PUC/SP. Autor de “Ontem ao luar: o cotidiano boêmio da cidade de Uberlândia (MG) nas décadas de 1940 a 1960”. Edufu, 2012.


Fonte: Revista Almanaque – Uberlândia de ontem e sempre, Ano 3, Nº 5,  agosto de 2013

REPORTAGEM : A UBERLÂNDIA DE JOÃO RODRIGUES BOLINHO: A CIDADE VISTA DO BAIRRO PATRIMÔNIO


Bolinho nasceu e vive no bairro Patrimônio até hoje, de onde viu a cidade se desenvolver (Foto: Cleiton Borges)
Uberlândia tinha pouco mais de 22 mil habitantes quando o sambista João Rodrigues nasceu, em 1941, no bairro Patrimônio, na zona sul. Bolinho – como ficou conhecido anos mais tarde – é o quarto de oito irmãos e o homem mais velho dos filhos. Casado por duas vezes e pai de cinco filhos, o aposentado de 72 anos declara seu amor pela cidade, mas afirma que tem saudade dos tempos em que era pouco maior que um povoado.

Da infância, Bolinho lembra-se das brincadeiras nos córregos e das frutas nos pomares do bairro onde nasceu, cresceu e onde mora até hoje com a família. “A cidade parecia mais uma fazenda, cheia de árvores e mato. Meus irmãos e eu fazíamos pequenos poços nos córregos e os batizávamos com nomes divertidos”, disse. Ele conta que na lateral da atual avenida Rondon Pacheco existiam lagoas que abrigavam jacarés. “Tinha muito mesmo, e tinha também rã, que a gente caçava.”

Segundo Bolinho, as casas eram espalhadas em diversos pontos. “Existiam poucos bairros e as casas eram maiores e mais abertas. As ruas não eram asfaltadas. Eram de terra e com pedrinhas conhecidas como ‘pé de moleque’”, afirmou. O bairro Patrimônio foi um dos primeiros fundados na cidade e era um dos poucos que existiam até a década de 1960. “Como no Patrimônio as ruas eram de terra, nós éramos chamados de ‘pés vermelhos’, mas não gostávamos do apelido. Se a gente fosse ao Centro – que hoje é o Fundinho – e alguém nos chamasse assim, dava briga”, disse.

Outra lembrança que marcou a vida do sambista foi o preconceito racial em meados do século 20. “Na avenida Afonso Pena, negros e brancos não dividiam o mesmo passeio. À esquerda [sentido Fundinho], passavam os brancos e à direita [mesmo sentido], os negros”, disse. A diversão também pregava a segregação racial. “No bar ‘A Mineira’, que era popular na cidade, negros não entravam de jeito nenhum. A cidade era muito preconceituosa e acho que ainda hoje carrega um pouco do preconceito racial”, afirmou.

Infância

A jovem cantora Tarsila Rodrigues estava com apenas sete meses de gestação quando João Rodrigues veio ao mundo, ainda prematuro. “Era aniversário de uma das minhas irmãs e minha mãe atravessou o rio de canoa para chamar os parentes que moravam do outro lado. Quando voltou, ela entrou em trabalho de parto e eu nasci”, disse. O apelido de Bolinho veio logo na primeira infância. “Eu devia ter uns 2 anos, e na época era comum que as mulheres colocassem pratos com bolo perto dos rádios. Numa dessas, meti a mão no prato e peguei um pedaço muito grande de bolo. O apelido pegou”, afirmou.

Aos 7 anos, Bolinho se mudou com a família para uma fazenda, onde ficou por dois anos. “Meu pai era meio aventureiro. Se dissessem que tava dando dinheiro em algum lugar, ele ia atrás”, disse. Depois da empreitada, o menino voltou para a antiga casa, no Patrimônio e, mesmo tendo se desfeito do imóvel, não saiu mais do bairro.

Com os 2 cruzeiros que ganhava da mãe aos domingos, Bolinho comprava o ingresso da matinê e ia se divertir no cinema da cidade. “Na verdade, o ingresso custava uns 50 centavos de cruzeiro. Com o resto, comprava pipoca e um monte de doces.” Outro lazer comum na época eram os bailes de carnaval e as festas nas casas de amigos. “O pessoal do Patrimônio sempre foi muito religioso e, depois da reza, sempre tinha um baile.”

O samba

Bolinho começou a cantar ainda criança, com pouco mais de 10 anos. “Aprendi vendo a minha mãe. Como ela cantava quase o tempo todo, com tudo o que ia fazer, fui assimilando isso e comecei a gostar.” Ele afirma que sua preferência sempre foi pelo samba, mas não descarta a oportunidade de ouvir música de qualidade de outros ritmos. “Gosto de música com melodia, arranjo e letra, não importa qual o estilo”, afirmou. Aos 13 anos, fundou a Escola de Samba Tabajara, que completa 60 anos de existência em 2014. “Fui eleito presidente de honra e desfilo todo ano pela escola. Amo samba e Carnaval”, disse.

Durante a vida, Bolinho conta que teve que trabalhar duro para conseguir vencer. “Comecei a trabalhar de carroceiro aos 9 anos. Ia acompanhando meu pai. Depois que ele faleceu, quando eu tinha 11 anos, virei o homem da casa porque era o filho mais velho dentre os homens e trabalhei em muitos lugares para ajudar minha mãe.” Segundo o sambista, a primeira tarefa era levar comida para os amigos do bairro que trabalhavam no frigorífico. “Saía de casa às 11h e carregava um cesto com 12 caldeirões de comida a pé até o local em que eles trabalhavam.” Depois disso, Bolinho também trabalhou em frigoríficos e fábrica de ladrilhos.

Repórter




segunda-feira, 26 de agosto de 2013

TABAJARA 2014 - RECORDAR É VIVER!

Reunião com os fundadores do carnaval de rua de Uberlândia. Emocionante a lucidez do nosso General LOTINHO e o amor por sua TABAJARA. Mais um momento mágico de nossa história!







terça-feira, 20 de agosto de 2013

TABAJARA 2014 - SINOPSE


Sinopse 2014
Tabajara Sociedade Recreativa 

  
“PÉ VERMELHO E FIDALGUIA.
TABAJARA: 60 ANOS DE ALEGRIA”

                        Em 2014 a Tabajara Sociedade Recreativa comemora os 60 anos de sua fundação. É a primeira escola de samba de Uberlândia, herdeira de um movimento étnico de resistência iniciado pela comunidade negra nos desfiles de ranchos carnavalescos como os “Tenentes Negros”. A escola foi criada no Bairro Patrimônio, antigo reduto de negros recém-libertos e que durante muitos anos foi a representação da segregação racial que existia (e ainda existe) na cidade.

            A Tabajara Sociedade Recreativa optou por este tema para homenagear seus fundadores, enaltecendo uma história de resistência contra o preconceito a partir dos desfiles de Carnaval. Também será enfatizada a história do povo do bairro Patrimônio, “berço” da cultura popular de Uberlândia, que continua resistindo contra o seu “desaparecimento” atualmente diante da especulação imobiliária que avança sobre o seu território.

            Para isso a Tabajara Sociedade Recreativa organizou seu enredo em quatro partes:

·         1ª parte: “Pé vermelho”
·         2ª parte: “Fidalguia”
·         3ª parte: Tabajara: 60 anos
·         4ª parte: de alegria (?).


1ª parte: PÉ VERMELHO


Segundo os dicionários a designação “pé vermelho” é um modo pejorativo para designar um caipira ou então uma pessoa de origem humilde que vivia em áreas urbanas sem calçamento. Também são chamadas assim as pessoas provenientes do interior de algumas regiões que apresentam o chamado solo “terra roxa” rico em barronite (um minério e que apresenta uma forte coloração vermelha devido aos óxidos de ferro presentes). No Rio de Janeiro o termo era aplicado aos moradores dos morros ou favelados.

Terra roxa: era como os imigrantes italianos chamam o solo do interior de São Paulo - “terra rossa” que em italiano quer dizer terra vermelha.

Os moradores do Bairro Patrimônio (e os de outras periferias de Uberlândia) também eram chamados pejorativamente de “pé vermelho” pela elite da cidade, que fazia referência ao barro e a poeira que eles traziam em seus pés, uma vez que moravam em locais sem calçamento. Era mais uma forma de discriminação que aquelas pessoas sofriam em uma cidade que já possuía a fama de ser muito racista e burguesa. SILVA (2010) nos relata que:

“aqui chamava pé vermelho é porque a terra era muito massapé, então no tempo das águas procê sair calçado, quase que cê precisava carregar uma pazinha procê vir tirando o barro, pra ir pra cidade. Cê pegava o calçado, calçava um chinelo, aí naquela subida ali da General Osório tem um calçamentozinho, macaquinho né? Daí cê tirava o chinelo e calçava o sapato, largava o chinelo, lavava os pé né? Aí quando passava de volta trazia”. 
(Sr. Quitute, morador do bairro Patrimônio; entrevistado em 03 de julho de 2007).


2ª Parte: FIDALGUIA

            Nesta parte do enredo a Tabajara Sociedade Recreativa pretende tratar da fantasia que transforma as pessoas durante o Carnaval. O sentido mais anárquico desta festa que transforma o pobre em nobre, o homem em mulher, o adulto em criança.
            Sabemos que o Carnaval era uma festa da elite. Bailes, Corsos e Cordões eram para os poucos que podiam confeccionar belas fantasias e gastar dinheiro com festas, confetes e serpentinas. Hoje quando se fala em carnaval no Brasil, logo vem a imagem das escolas de samba, do samba e da hegemonia do negro. Mas nem sempre foi assim. A conquista do Carnaval pela música e dança do negro – o samba – foi uma luta contra o preconceito e por direitos iguais, inclusive o direito de comemorar na rua. Acreditamos que essa luta dos negros ocorreu em quase todos os lugares, inclusive em Uberlândia – uma cidade que se emancipou sob os ares da aristocracia republicana de 1888-1889.
            Sabemos que a abolição da escravatura (1888) não livrou o negro da miséria, da segregação sócioespacial e do preconceito. A Estação Primeira de Mangueira do Rio de Janeiro cantou no carnaval de 1988 durante os 100 anos da Abolição, a atual condição do negro: Livre do açoite da senzala, preso na miséria da favela”. A história do bairro Patrimônio e dos chamados “pés vermelhos” reafirmam isso.
            Por isso a fidalguia, a nobreza dessa luta. Narrar a conquista da avenida pelos ranchos negros e a saga das escolas de samba para conquistar território no carnaval de Rua, principalmente a partir da criação da Tabajara, é relembrar a luta para vencer a apartação social que era uma triste realidade da cidade de Uberlândia.
            É de conhecimento histórico que Uberlândia foi uma cidade segregadora, que apartava negros e brancos espacialmente em bairros com maioria de população negra, como o Patrimônio. Além disso, apartava negros e brancos em cinemas, proibia a entrada de negros em clubes aristocráticos e dividia as calçadas das ruas entre brancos e negros durante o chamado footing do carnaval e dos finais de semana.
Foi a partir da coragem dos ranchos negros como os “Tenentes Negros” que o carnaval de Uberlândia começou a combater o preconceito racial. Atraindo muita gente quando passavam com seus batuques e cantorias, os negros mesmo reproduzindo a fidalguia dos carnavais daquela época, promoviam uma mistura de todo o tipo de gente após seus desfiles.
Os ranchos traziam balizas que funcionavam como abre-alas. Depois vinham: porta estandarte com sua guarda (o que mais tarde viria a ser a porta-bandeira e o mestre sala) e por último os bailarinos femininos e masculinos, todos misturados. Na rabeira vinham todos os foliões que se deixavam levar pela percussão e pelos instrumentos de sopro. A saída dos ranchos negros foi o início da democratização do Carnaval de Rua de Uberlândia. Apesar de ser uma festa de rua, o Carnaval era muito elitizado, apartando negros e brancos.
Integrantes do rancho "Tenentes Negros"
in:SILVA, Antônio P. As histórias de Uberlândia. Vol. 1 p.93
            A fidalguia de seus desfiles manifestava-se para além das roupas de duques e de damas. A fidalguia destes negros foi sendo alcançada por meio da luta por direitos iguais, contra o racismo e o preconceito. Lutando contra as injustiças, os ranchos negros transformaram-se na maior atração do Carnaval de rua. As empresas passaram a oferecer premiações aos campeões (muitos dos componentes destes ranchos  trabalhavam nessas empresas, provocando certa disputa entre elas).
            Os ranchos negros como Tenentes Negros, Turunas e Flor de Maio foram precursores desta luta, mantendo a hegemonia do carnaval nos anos de 1930. Infelizmente em 1946 os Tenentes não existiam mais. No entanto, em 1954 surge a primeira escola de samba de Uberlândia – a Tabajara – para dar continuidade a essa luta.




3ª parte: TABAJARA: 60 ANOS


"Se as lembranças às vezes afloram ou emergem quase sempre são uma tarefa, uma paciente reconstituição."
Ecléia Bosi
          
Nesta parte do enredo pretendemos homenagear os “bambas”, as personagens históricas e os precursores da Tabajara Sociedade Recreativa Escola de Samba fundada em 1954 no Bairro Patrimônio por iniciativa do Mestre Lotinho. É a escola de samba mais antiga e a maior campeã do Carnaval de Rua em Uberlândia. Até o momento a escola coleciona 22 títulos sendo que, dos nove últimos, as conquistas foram consecutivas. Os mestres Pato e Lotinho pensaram em criar a Tabajara a partir de um bloco carnavalesco com sede no extinto bar "Caba Roupa" ou José do Patrocínio, reduto de negros localizado na Vila Osvaldo. A idéia de formar uma escola de samba aos moldes do carnaval do Rio de Janeiro era uma tentativa de recuperar espaço e diversão, como havia ocorrido com os ranchos negros na década de 1930.
Primeiros integrantes da Tabajara – 1954
Fonte: SILVA, Antônio P. História do Carnaval de Uberlândia. Uberlândia: 2007

       O nome da escola foi inspirado na Orquestra Tabajara de Severino Araújo do Rio de Janeiro. Mestre Lotinhocrooner único e primeiro cantor negro a se apresentar nos clubes de Uberlândia – era fã da orquestra e fiel ouvinte de seus shows transmitidos pela Rádio Nacional. A primeira fantasia dos integrantes da Escola (Figura 3) foi em homenagem aos índios Tabajaras. O termo “Índio” para o Mestre Lotinho era dado a todos aqueles que não sabiam sambar, mas que mereciam desfilar. Até hoje a “Ala dos Índios” é uma das mais tradicionais alas da escola.

O curioso é que a nossa escola de samba é uma entidade de perfil afro. No entanto tem sua origem associada a um indígena brasileiro da etnia Tabajara (do tupi tawa = aldeia e yara = senhor). Mestiçagem típica do Brasil.


Pavilhão da escola de samba Tabajara Sociedade Recreativa

A saga em formar uma escola de samba talvez fora a mesma de se formar um rancho carnavalesco negro. Não era apenas a conquista do direito à folia no Carnaval. Mas antes de tudo era a luta contra a discriminação e o preconceito racial, cultural e social, considerados “normais”. A rua não promovia a mistura das pessoas chamadas de diferentes (seja por diferenças na cor da pele, sexo, credo, classe social, etc.) apesar de ser (ou devesse ser) um espaço de domínio público. O carnaval não era para todos, apesar de ser a “maior festa popular do mundo”. Algo deveria mudar!

Em uma reunião entre amigos durante comemorações familiares surge a Tabajara para fazer parte da história de Uberlândia.

Ao longo de sua existência a Tabajara foi marcada por fatos curiosos que justificam homenagens à sua história: sua fundação inspirada no movimento dos ranchos negros e sua origem no Bairro Patrimônio – um verdadeiro quilombo urbano. O nome da escola em homenagem a uma orquestra carioca que inspirou o fundador da escola Mestre Lotinho - primeiro cantor negro a se apresentar em aristocráticos salões de Uberlândia e região. 


In: SILVA, Antônio P. História do Carnaval de Uberlândia. Uberlândia, 2007 p.10

A opção de desfile da Tabajara segundo Mestre Lotinho foi inspirada em filmes vistos por seus fundadores nos cinemas da cidade e também nos desfiles das escolas de sambas do Rio de Janeiro. Também havia uma mistura do samba com batuques do Congado – uma festa tão afro-mineira.

Como precursora das escolas de samba de Uberlândia a Tabajara colecionou muitas vitórias e muitas derrotas. Segundo SILVA e o Mestre Lotinho a escola foi 17 vezes campeã consecutivamente, com intervalo apenas em 1958, quando perdeu para a escola de samba Princesa Isabel. Ficou afastada dos carnavais por brigas com o poder público durante vários anos das décadas de 1960 e 1970, voltando a ganhar o campeonato somente em 1983, quando homenageou Adoniran Barbosa, com o tão esperado retorno do Mestre Lotinho na avenida. Entre 1984 e 2003 a Tabajara ficou sem ganhar nenhum título, jejum que foi quebrado em 2003 e que a partir de 2005 até 2013 transformou-se em vitórias consecutivas.
                
Sendo a primeira escola de samba de Uberlândia, foi natural que Tabajara inspirasse a criação de outras escolas de samba. Foi assim que aconteceu com a “Pavão Dourado”, escola de samba do Bairro Martins. Da Tabajara também saíram componentes que criaram outras agremiações como a escola de samba “Princesa Isabel” (Zé Pretinho), “Unidos do Capela” (Capela) e “Unidos do Chatão” (Pai Nego). Desta forma a Tabajara guarda a história e o legado de ser primeira escola de samba do carnaval de rua de Uberlândia. Com todas as dificuldades, comunidades se organizaram e criaram outras escolas de samba como:
·         Última Hora (fundada por Du Marier)
·         Pavão Dourado (fundada por Eugênio Silva)
·         Garotos do Samba (fundada por Otávio Afonso – Mestre Bolo)
·         Imperiais do Samba (fundada por Zé Pretinho)
·         Acadêmicos do Samba (fundada por Ary de Castro Santos)
·         Unidos do Luizote (fundada por Vininho),
·         Unidos do Chatão (fundada pelo Pai Nego)
·         Unidos do Capela e Princesa Isabel  (fundada por Eurípedes Bernardes de Assis – O Capela)
·         Cidade Industrial, dentre várias outras bandeiras.

Precisamos salientar que foi a partir dos desfiles do Carnaval que o “apartheid” existente no carnaval e no dia a dia de Uberlândia foi sendo diluído, misturando e promovendo festa entre pessoas iguais -  sejam brancos ou negros – pelo menos durante os dias de folia. Para o Mestre Lotinho essa foi a sua maior contribuição.

Para além de sua tradição, a Tabajara também se consolidou como um patrimônio cultural de Uberlândia, contribuindo para a criação de Arte e Cultura em vários campos como: composições musicais, danças, cenografia, teatro, literatura, artes plásticas, figurino/costura, serralheria e concepção de estruturas para carros alegóricos dentre outros. O Samba além de ser uma diversão, tornou-se também veículo para a apresentação de um grande espetáculo que informa a população sobre temas contemporâneos ou resgata a memória de nossa história.

 Em seus enredos a Tabajara já cantou na avenida temas sobre ecologia e meio ambiente, crítica social, origens de nossa culinária, história do congado e de outras culturas como o bumba-meu-boi, histórias de Uberlândia e de seus ilustres filhos, homenagens a artistas ou a povos que contribuíram para o progresso não somente  econômico, mas também e principalmente o progresso cultural de nossa cidade. 

Carro Alegórico do enredo “Bota Rei Congo no Congado” – Carnaval de 2009.
            (Disponível em
http://tvc-canal7.blogspot.com.br/2012/02/tabajara-sociedade-recreativa-historia.html Acesso em 07 novembro de 2013)

Comissão de Frente do Desfile da Tabajara em 2012 – Peguei um pau-de-arara no Sertão da Caatinga e no Cerrado eu vim morar”
(Disponível em http://migre.me/fGesh Acesso em 06 de ago. de 2013)                                            

                           Comissão de Frente “O Mito da Criação na Aurora dos Deuses Nagôs”– Carnaval de 2013.                                                        (Disponível em http://migre.me/fGe4k Acesso em 06 de ago. 2013)


Veja as conquistas que a escola vem acumulando nos últimos anos:


4ª parte: DE ALEGRIA 

Nesta parte do enredo a Tabajara pretende fazer um protesto contra o “desaparecimento” do Bairro Patrimônio – um celeiro da cultura popular de Uberlândia – diante da especulação imobiliária que tem aguçado a disputa por seu território.

Como local que abrigou os negros forros e as pessoas mais pobres de Uberlândia, o bairro Patrimônio foi vítima da segregação sócioespacial e racial, tornando-se praticamente um quilombo urbano às margens do desenvolvimento que chegava até a cidade. Durante muito tempo seus habitantes apenas tiveram oportunidades de trabalho e de sobrevivência em atividades poluidoras e degradantes como o Matadouro Municipal e a Charqueada Omega.  Essa exclusão social e territorial fez com que as pessoas construíssem sua identidade por meio da cultura, uma vez que na cidade os moradores de um quilombo não caçam, não plantam e nem pescam. 




A identidade do povo chamado de “pé vermelho” foi criada por meio de manifestações populares como a Congada, a Folia de Reis e o Carnaval (a partir da criação da Tabajara). E o Bairro Patrimônio foi o “berço” desta cultura popular em Uberlândia.

Folia dos Santos Reis no bairro PatrimônioDisponívelhttp://migre.me/fGeiM Acesso em 06 de ago. de 2013
No entanto, com o crescimento urbano e a decisão do plano diretor de que a cidade deveria crescer mais para a direção sul do município, o Bairro Patrimônio ficou no eixo de grandes empreendimentos projetados para a Zona Sul. São empreendimentos predominantemente elitizados como Shopping Center, condomínios horizontais, galerias de conveniência, restaurantes, clínicas médicas e de estética que desfrutam da proximidade de um público mais abastado, da proximidade de clubes requintados como o Cajubá e o Praia Clube além da bela vista panorâmica que se tem no bairro do centro da cidade (a paisagem também tornou-se mercadoria). O Patrimônio ficou “ilhado” entre bairros elitizados. Houve tentativas de “desaparecer” com o bairro Patrimônio a partir de fragmentações em loteamentos como o Copacabana, Altamira e Morada da Colina.


Mapa da atual configuração territorial do bairro Patrimônio – 2013            Disponível em http://migre.me/fGdwCAcesso feito em 06 de ago.2013

Na nova proposta de formatação dos bairros realizada pela prefeitura, deveriam ser fundidos os bairros menos populosos. Neste caso, curiosamente, ocorreu o contrário. Foram fundidos os mais populosos (Patrimônio e Copacabana – a parte do Patrimônio altamente verticalizada) e foram mantidos os menos populosos e mais abastados como os bairros Altamira e Morada da Colina.


Outro fator que nos chama a atenção são os conflitos que passam a existir entre os antigos e novos moradores. Os antigos querem manter suas tradições. Mas as manifestações culturais do bairro não agregam mais seus moradores porque eles possuem histórias diferentes, ao contrário do que ocorreu no passado. Durante a formação do bairro Patrimônio, a exclusão acabou por unir os moradores que criaram uma identidade cultural ao participarem de eventos e festas comunitárias como a Congada, a Folia de Reis e o Carnaval todas elas realizadas nas ruas. 


Terno de Congado Moçambique Princesa Isabel
Terno de Congado Moçambique Pena Branca
Terno de Congado Moçambique Raízes
Já a maioria dos novos moradores de classe média, média alta ou alta não se misturam com os antigos moradores. As festas os incomodam e, frequentemente, há reclamações do barulho, das movimentações nas ruas e dos transtornos provocados no trânsito quando ocorrem estas manifestações. As casas simples atrapalham as vendas de apartamentos novos e de mansões, além de outros empreendimentos comerciais destinados à elite. É um conflito constante. Como todo conflito tem um lado mais fraco, a memória do Patrimônio está sendo apagada e o bairro está “desaparecendo”.  A divisão das heranças e a necessidade financeira também têm contribuído para expulsar o antigo morador do bairro para outros lugares da cidade.
Preocupante também é o fato de que a diversificação de pessoas no território do Patrimônio não promoveu sua integração. Isso acabou por gerar intolerâncias e episódios de violência.
 Foi assustador encontrar em um famoso site de busca algumas notícias sobre o Patrimônio e nos deparar, em primeiro lugar, com a notícia de uma chacina ocorrida em agosto de 2012 que deixou nove feridos, sendo que quatro morreram. Com tanta história e riqueza cultural, é deprimente ver que um bairro tão tradicional não está apenas sendo “apagado”. Ele está sendo consumido pela expansão do capital que traz consigo também algumas mazelas sociais como furtos, roubos, assassinatos e tráfico de drogas, dentre tantas outras formas de violência.


Rua Ipanema no bairro Patrimônio          Disponível em http://migre.me/fE6uQAcesso em 06 de ago. de 2013
A apartação social se manifesta no espaço e se materializa na paisagem como podemos conferir na Figura 14 acima onde à esquerda podemos ver calçadas e construções do “novo” Patrimônio: bem feitas, modernas, com verticalização que maximiza o uso do solo como mercadoria. Já à direita vemos calçadas e casas simples do “velho” Patrimônio. Ao fundo, a silhueta do Fundinho e do centro da cidade, altamente verticalizados. O centro histórico de Uberlândia também está “desaparecendo”.
Essa apartação social não é só percebida por meio das construções. Ela é manifestada no abismo social entre os muito ricos e os muito pobres.

Sobre essa dura realidade é a escola encerra seu desfile com um questionamento: 

Alegria (?).





sábado, 20 de abril de 2013

TABAJARA 2013 - ENEACAMPEÃ

A Diretoria da escola de samba Tabajara Sociedade Recreativa agradece a todos que praticiparam  direta ou indiretamente da conquista de mais um título.

Parabéns comunidade Tabajara!

Parabéns Patrimônio!

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Breve Histórico da Escola de Samba Tabajara

A Escola de Samba Tabajara de Uberlândia foi criada em 1954 pelos mestres Pato e Lotinho a partir de um bloco carnavalesco com sede no extinto bar "Caça Roupa" ou José do Patrocínio, reduto dos negros de numa cidade que era extremamente segregadora e racista.

O nome foi inspirado na Orquesta Tabajara de Severino Araújo, e em homenagem aos índios Tabajaras, que inspiraram a primeira fantasia de seus componentes foliões.
Em 1956 a Rádio Educadora de Uberlândia realizou o primeiro concurso de escolas de samba da cidade, sendo a Tabajara sua primeira campeã. Também foi campeã do primeiro concurso oficial do carnaval de Uberlândia em 1957.

Daí em diante temos uma história de vitórias mas também de amargas derrotas, como todas as escolas de samba do Brasil, chegando a TABAJARA ficar 18 anos sem nenhum título.

A escola de samba tem vários redutos no Bairro Patrimônio como os "clãs" da Dona Fiinha (Tia Didia, Leka, Dida e demais familiares) e sua linda ala das baianas nota 10, sempre; o "clã" da Dona Meire (a decana Dona Filinha, a saudadosa Adriana e demais familiares)e sua elegante ala; do Mestre Bolinho (com sua humildade e simpatia); do Mestre Nei (e todos os membros da bateria nota 10); do Mestre Lotinho (co-fundador da escola); a Toca do Bugre e do Samba do Almir (e a garra na avenida de sua esposa Rosana - a baiana rica); o Bar do Bicão (e da saudosa Teresa), dentre tantos outros nomes importantes que compõem a Velha Guarda e a Diretoria da Escola.

Não podemos deixar de mencionar a importância de outros membros da escola (seja da comunidade ou apenas simpatizantes) como Dona Mariinha, Léo (querido Léozinho, sempre atuante), Tia Fatinha, Tia Lenica, os grandes passistas masculinos como "seu" Pé-de-Ferro e Gil , o vereador Baiano (Hélio Ferraz que sempre ajuda na estruturação da escola) e sua animadíssima ala, "seu" PC e família, Regina (ô inferno!!!) e família. A eterna madrinha de bateria Fernanda e a sensualidade de Kizzy Mary e demais passistas (como Juliana e Cíntia), a dançante ala do Baiador e as tradicionais alas dos índios tabajara e dos esnobes (com suas coreografias mistas). Wesley e toda Comissão de Frente, além de todos os destaques (o grupo 3M = Marcelo, Maristela, Marco Tulio), trabalhadores do barracão, admiradores.

A juventude também está presente com a cativante ala das crianças (coordenada por Cláudia), Pablo e sua galera na bateria, os esnobes (feminino e masculino), Nei Júnior que já é um diretor de bateria (apesar da pouca idade) e o Júnior, que com sua mãe Priscila, compõe o casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira nota 10!!!

A tradição resiste e vem sendo passada de pai para filho por meio da afirmação cultural do Samba e do Congado. Recentemente a escola vem passando por uma reestruturação que a tem aproximado da sociedade de Uberlândia. Por isso, seus ensaios tornaram-se opção de entreterimento e cultura, nos dias que antecedem o Carnaval, além de atividades ligadas ao Samba durante todo o ano. Mesmo assim, a comunidade Tabajara tem dificuldades de ensaiar nas ruas do bairro, devido a não-simpatia de alguns moradores que desconhecem e desvalorizam as manifestações culturais do Patrimônio.

Em 2011, sob a batuta do carnavalesco Flávio Arciole e dos presidentes Davi/Moicano (2005/2006/2007), Luciano Moicano/"seu" PC (2008/2009) e Priscila/Pablo (2010/2011)e suas diretorias, a escola obteve o heptacampeonato (repetindo o êxito dos carnavais de 1956 a 1961). 


Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/SRES_Tabajara

      Veja também:

      Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...